“Na vida só há um modo de ser feliz. Viver para os outros.”

Léon Tolstoi

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

CONTEXTO HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL NO BRASIL



                                                                                                                         Por Ana Paula Cairos


As reflexões sobre educação inclusiva tem sido tema constante de discussão, consideramos que retomar o trajeto histórico da Educação Especial é de fundamental importância para que possamos contextualizar as práticas desenvolvidas atualmente.
De acordo com SASSAKI (1997), o percurso histórico da educação especial delibera quatro fases: a fase da exclusão, da segregação, da integração e da inclusão.
Para RAGONESI (1997) o Brasil tem sido considerado o pior do mundo em questão de Educação. Segundo o autor nunca existiu uma política educacional comprometida com a democratização educacional.

A Primeira Constituição Brasileira promulgada em 1823, que estabeleceu a instrução primária como obrigatória, gratuita e extensiva a todos os cidadãos tem mostrado um quadro bastante diferente do proposto.
A política educacional sempre esteve relegada à segundo plano. O descompromisso histórico do Estado não passa de fruto de um processo político, no qual ele se evidencia a favor dos interesses das classes dominantes.
 MENDES (1991) e BUENO (1993) ratificam como marco no Brasil, a criação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos e do Instituto dos Surdos-mudos, na cidade do Rio de Janeiro, que devido a  conflitos, de ordem social, econômica e política, entraram em processo de deteriorização. Estes institutos foram espelhados nos institutos franceses, no entanto uma característica os diferenciava: tinham caráter assistencialista, ou seja, política de “favor”. De acordo com BUENO (1993), enquanto os institutos brasileiros de educação especial exerciam seu papel de auxílio aos desvalidos, os parisienses adotavam o sistema de oficinas de trabalho.
MENDES (2006) afirma que desde o século XVI a história  da educação no Brasil vem sendo desenhada. Educadores e médicos daquele período histórico já abancavam a ideia de considerar as pessoas deficientes ineducáveis. Contudo, naquele momento, o cuidado era puramente assistencialista e institucionalizado, por meio de manicômios e abrigos.
No período Imperial os doentes mentais eram tratados apenas em hospitais psiquiátricos. Os surdos e cegos eram isolados e retirados do convívio social, sendo tal isolamento completamente desnecessário. Também neste período, foram iniciados tratamentos no Hospital Psiquiátrico da Bahia, em 1874.
Dessa maneira, os esforços tinham como objetivo a cura ou a correção dos “defeitos” apresentados pelos sujeitos. A intenção era buscar aproximá-los da “normalidade” através do tratamento médico, para que pudessem ter uma vida “normal” em sociedade.
Em 1889, a educação especial ainda não era totalmente assumida pelo Estado. Em São Paulo e no Rio de Janeiro começaram a funcionar algumas salas de aula para alunos deficientes, vinculadas a escolas públicas, mas o acesso a elas apenas ocorreria na segunda metade do século.
 Em 1891, instaura-se o federalismo e, com isso, as responsabilidades pela política educacional aumentam; na área médica, o interesse pela educação dos deficientes começa com os serviços de higiene mental e saúde pública, que deu origem à inspeção médica escolar.
A partir do século XX, os deficientes passam a ser considerados cidadãos, com direitos e deveres de participação na sociedade.
Embora, de forma ainda muito lenta, após a Proclamação da República, a educação especial foi se expandindo; em 1903 o Pavilhão Bournevile , no Hospital D. Pedro II (Bahia) foi instalado para tratamento de doentes mentais, em 1911 é criada em São Paulo a inspeção médica - responsável pela criação de classes especiais e formação de pessoal para trabalhar com esta clientela.
Neste período, segundo MENDES (2001), prevaleceu o descaso em relação à educação especial, visto na criação de instituições para atendimento de casos mais graves, enquanto os mais leves eram ainda indiferenciados, em 1923 foi criado o Pavilhão de Menores do Hospital do Juqueri e o Instituto Petalozzi de Canoas, em 1927.
Com relação aos deficientes visuais, surgiram: a União dos Cegos do Brasil, no Rio de Janeiro, em 1924, o Instituto Padre Chico, em São Paulo e o Sodalício da Sacra Família, no Rio de Janeiro, em 1929. Além do surgimento dessas entidades privadas começaram às preocupações, por parte da República Escolar, com os deficientes mentais. As  primeiras entidades privadas contribuíram para a inclusão da educação especial no âmbito das instituições filantrópico-assistenciais e a sua privatização, salienta BUENO (1993).
Com a revolução de 1930, novas mudanças sociais, históricas, políticas, econômicas e culturais ocorreram no país. A questão educacional, passa a ser uma “preocupação” da própria sociedade. Nos anos seguintes, o número de entidades para atendimento de deficientes aumentou de forma significativa, no entanto não eram entidades públicas. 
 O fato de que o Estado não se responsabilizava de maneira satisfatória, institutos de assistência passaram a assumir a educação especial e assim a Sociedade Pestalozzi  do Brasil com sede em Belo Horizonte é criada em 1932, além da fundação Dona Paulina de Souza Queiroz, em São Paulo (1936). Em 1941, no Recife, surgiu a Escola Especial Ulisses Pernambucano e a Escola Alfredo Freire (BUENO, 1993).
A respeito da Sociedade Pestalozzi, GUARINO (2005, p.6) relata:
“O movimento Pestalozziano (...) está fazendo 80 anos e em franco processo de evolução,  fazendo um trabalho exemplar, na inclusão do portador de deficiência  na sociedade e mais que isso, dando educação de qualidade àqueles que nos procuram. Hoje mais de 220 mil crianças estão nas salas de aula, sendo que 80% desse total em instituições como APAE e Pestalozzi”.
 O interesse pelo deficiente mental, refletia também em uma preocupação com a higiene. Para BUENO (1993), essa preocupação é interpretada como o início de um processo de segregação pelos especialistas do aluno diferente.
Foram criados, também, com relação aos deficientes visuais, os Institutos de Cegos do Recife, da Bahia, de São Rafael (Taubaté – SP), de Santa Luzia (Porto Alegre – RS), do Ceará (Fortaleza), da Paraíba (João Pessoa) e do Paraná (Curitiba). Em 1938 foi criada, no estado de São Paulo, a Seção de Higiene Mental, do Serviço de Saúde Escolar, da Secretaria da Educação do Estado. No Rio de Janeiro, trabalho semelhante foi realizado (BUENO, 1993).
Com o fim da ditadura Vargas, em 1945, o Brasil vivenciava a redemocratização política,  a Organização das Nações Unidas (ONU) defendia a promoção da paz e da democracia. Dessa maneira, a educação de adultos  passa a ter destaque. Dentre os educadores mobilizados com a ação encontramos Paulo Freire, Lourenço Filho, entre outros. 
Entre 1948 e 1961 medidas como criação dos conselhos estaduais de educação e a cooperação financeira assegurada por lei às escolas privadas influenciaram a educação especial. Segundo MENDES (2001) no período de 1950 a 1959, houve uma grande expansão no número de estabelecimentos de ensino especial para portadores de deficiência mental; 190 estabelecimentos de ensino especial, no final da década de 50, eram públicos e em escolas regulares.
Em 1954, foi fundada a APAE Rio, sendo a primeira APAE do Brasil. Com o passar dos anos as APAEs se expandiram por todo o país e pelo mundo, sendo considerado o maior movimento filantrópico na área de deficiência mental.
 A partir de 1958 o Ministério da educação começa a prestar assistência técnica-financeira às secretarias de educação e instituições especializadas.
Nota-se, neste período, o aumento de escolarização para as classes mais populares e a implantação de classes especiais para os casos leves de deficiência mental.
 O golpe militar de 1964 causou uma mudança abrupta nos projetos políticos em todas as áreas, inclusive na educação. Muitos educadores passaram a ser perseguidos em função de posicionamentos ideológicos.
Para FERREIRA e GLAT (apud SOUZA, 2003) somente a partir da segunda metade da década de 60 nasceu a ideia da educação especial escolar se integrar aos sistemas de ensino, expandindo o acesso ao ensino primário. No entanto ainda de maneira segregacionista.
“Antes da proposta de inclusão, o que se tinha era a aplicação do conceito da integração, mas de modo segregativo. A proposta era que a pessoa deficiente, ou aquela que destoava do grupo por qualquer motivo, fosse aceita na sociedade, desde que se adaptasse às condições estipuladas, como classes especiais, cursos de adaptação,  trabalho em setores ou horários diferenciados, entre outros. Desse modo a integração oferecia uma falsa idéia de igualdade, segregando ainda mais e causando muitos traumas”. (SASSAKI, 2005)
Em 1973 é criado o Centro Nacional de Educação Especial – CENESP, junto ao Ministério da Educação. No final da década de 70 são implantados os primeiro cursos de formação de professores na área da Educação Especial e em 1978 pela primeira vez uma emenda à Constituição Brasileira assegura aos deficientes a melhoria de sua condição social e trata do direito à educação especial e gratuita.
Se, na atualidade, há um discurso em busca pela inclusão, é possível dizer que nas décadas de 80 e 90 esta noção já começa a se esboçar na medida em que a sociedade passa a lutar mais por seus direitos.
O conceito de inclusão e sua aplicação como meio de oferecer oportunidades iguais a todos e o reconhecimento da diversidade entre as pessoas ganham destaque em 1981, com a ONG DPI (Disabled Peoples International), que assinala a necessidade de a sociedade (incluindo a escola) equiparar as oportunidades para todos, viabilizando os meios, como remoção de barreiras (físicas, intelectuais, emocionais, relacionais, entre outros) que impeçam qualquer um de participar em todas as áreas (SASSAKI, 2005).
Órgãos governamentais e não governamentais perceberam a necessidade de repensar a integração de pessoas que estavam à margem da sociedade.  Esses Esses estudos e discussões, resultaram  na substituição, ainda que lentamente, da integração pela inclusão.
Em 1985 é criado pelo governo federal um comitê para planejar, fiscalizar e traçar políticas de ações conjuntas na questão dos portadores de deficiência. Em 1986 é criada a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência.
Em 1988 é promulgada a Nova Constituição, garantindo atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino elegendo como um de seus princípios a “igualdade de condições de acesso e permanência na escola” (art.206, inciso I) garantindo a todos o direito à educação e ao acesso à escola, sendo que não se poderia excluir nenhuma pessoa em razão de sua origem, raça, sexo, cor, idade, deficiência ou ausência dela.
A Lei Federal de número 7853 de 1989  estabelece a oferta obrigatória e gratuita da  educação especial em escolas públicas e prevê crime punível com reclusão e multa para os dirigentes de ensino público ou privado que se recusarem ou suspenderem sem justa causa a matrícula de um aluno portador de necessidades especiais. 
Em 1990 a Secretaria Nacional de Educação Básica assume a responsabilidade na  implementação da política de educação especial e o Brasil aprova o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que reitera os direitos garantidos na Constituição de 1988.
 Em 1994, promovida pelo governo da Espanha e pela UNESCO, foi realizada a Conferência Mundial sobre Necessidades Educacionais Especiais culminando na Declaração de Salamanca, sobre princípios, política e práticas em Educação Especial. Este tem sido até hoje o documento-guia:
“Escolas regulares que possuam tal orientação inclusiva constituem os meios mais eficazes de combater atitudes discriminatórias criando-se comunidades acolhedoras construindo uma sociedade inclusiva e alcançando educação para todos” (UNESCO, 1994, p.1).
Em 1996 a Lei de Diretrizes e Bases propõe o atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com necessidades especiais, preferencialmente na rede regular de ensino (Art.4º, III). O Plano Nacional de Educação (2001)   [...] estabelece o direito das pessoas com necessidades especiais receberem educação preferencialmente na rede  regular de ensino (Seção 1, III, 8.1) e afirma como diretriz atual a plena integração dessas pessoas em todas as áreas da sociedade (p.13)
Garantia de ensino fundamental obrigatório de oito anos a todas as crianças de 7 a 14 anos, assegurando o seu ingresso e permanência na escola e a conclusão desse ensino [...];
Garantia de ensino fundamental a todos os que não tiveram acesso na idade própria ou não o concluíram [...];
Ampliação do atendimento nos demais níveis de ensino – educação infantil, ensino médio e educação superior [...] (p.8).
Atualmente educadores compreendem a importância da inclusão, mas ainda faz-se necessário transformações mais abrangentes. Além da equiparação de oportunidades, é indispensável que haja respeito, aceitação do outro como ele é, acolhimento, empatia e o estímulo ao sentimento de pertencimento à comunidade acadêmica.
MC LAREN (1997) considera que  “mesmo que seja provavelmente verdade que as escolas não podem refazer a sociedade, elas devem encontrar maneiras melhores de tornarem-se locais vitais para todos os estudantes, locais onde eles possam aprender a usar os instrumentos para ganharem um senso de controle sobre seus destinos, em vez de sentirem-se presos pelo seu status social” (p, 183).
Ressaltamos que na trajetória histórica das políticas educacionais de inclusão no Brasil os vários procedimentos foram construídos pelas intencionalidades e interesses do Estado, apresentando-se de forma diferenciada nos vários momentos de nossa história. Compreendê-los significa abranger as contradições que se apresenta na história brasileira constituída de diversidades muitas vezes negada em função de políticas de Estado.
O desinteresse e o descaso político prevaleceu durante quase toda a história, deixando a responsabilidade da educação de deficientes para as instituições de caráter assistencialista baseada em políticas de “favor”, na qual o descaso do Estado  pode ser observado até os dias de hoje. Embora, alguns  autores considerem que, mesmo lentamente, foram muitos os avanços ocorridos nesta área, consideramos que a problemática de exclusão/inclusão educacional permanece até os dias de hoje.
Há de se observar que a legislação existe de modo a favorecer os portadores de deficiências, no entanto sua aplicabilidade ainda não é efetivada.
          
REFERÊNCIAS:
FERREIRA, J. R. e GLAT, R. Reformas educacionais pós LDB: a inclusão do aluno com necessidades especiais no contexto da municipalizaçãoIn: SOUZA, D. B. & FARIA, L. C. M. Descentralização, municipalização e financiamento da educação no Brasil pós LDB. Rio de Janeiro: Editora DP&A, 2003.
McLAREN, Peter. Multiculturalismo. São Paulo: Cortez, 1997.
ONU/UNESCO (1994). Declaração de Salamanca sobre princípios, política e prática em educação especial.
RAGONESI, M. E. M. M. Psicologia escolar: pensamento crítico e práticas profissionais. Tese (Doutorado em educação) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 1997.
SASSAKI, Romeu K. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio de Janeiro, WVA, 1997.

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Em Pernambuco, escolas do campo ajudam a romper a cerca da exclusão escolar

A luta dos Sem Terra pela educação de jovens e adultos no campo pernambucano superou um histórico de exclusão.


Em preparação ao 2° Encontro Nacional dos Educadores e Educadoras da Reforma Agrária (ENERA), que acontecerá entre os dias 21 a 25/09, em Luziânia (GO), a Página do MST traz uma série de entrevistas, reportagens e artigos sobre experiências da Educação do Campo, o atual cenário educacional do país e os desafios que se anunciam sobre este debate. 

Por Guy Zurkinden

Fotos Luiz Mario Santana

Há quem diga que a história da educação do campo em Pernambuco nasce no município de Santa Maria da Boa Vista, no Vale de São Francisco, sertão do estado. O ano data de 1995, quando 2.200 famílias Sem Terra ocuparam a Fazenda Safra, no mês de agosto. Daí em diante pipocaram acampamentos de famílias Sem Terra sobre as fazendas falidas da região, outrora ocupadas por monocultivos de frutas destinados à exportação.

Vinte anos depois, o trecho ficou conhecido como “a estrada da Reforma Agrária”, rodeado por assentamentos e pequenos lotes irrigados, onde brotam plantios de maracujá, uva, goiaba, melancia, manga, macaxeira e banana, ligando os municípios de Santa Maria da Boa Vista e Petrolina.

Na beira da pista, porém, os barracos dos acampamentos Hugo Chávez e Filhos da Luta demarcam que a luta pela terra ainda não terminou.
 Um dos resultados desse processo é a escola Franscesco Moura, localizada no “Mãe Safra” – como é chamado o assentamento mais antigo de Santa Maria -, onde acontece um dos cursos de Educação de Jovens e Adultos (EJA).

Assentada no Safra, Júlia Nunes de Lima Ferreira é mãe de cinco filhos, todos adultos.


Em 1995, dona Júlia montou o barraco na beira do rio São Francisco, junto às 2.200 famílias Sem Terra. Daquela época, a agricultora tem lembranças de alegrias e sofrimento. “Foi um tempo difícil, mas todo mundo era amigo. Um quilo de açúcar, todo mundo dividia.” Após dois anos e cinco meses de resistência, nascia o assentamento Safra.

Como milhares de trabalhadores do meio rural, a camponesa teve o direito à educação negado. “Fiz só a primeira e a segunda série. Onde fui criada, não funcionava escola, nem transporte escolar”. 

Para chegar à escola mais próxima, Dona Júlia e a irmã tinham que caminhar mais de uma hora. Mas com medo que acontecesse alguma coisa com as filhas, sua mãe acabou proibindo as viagens. 
À Júlia só ficou “aquele sonho, de terminar os estudos.” Em 1999, porém, a então recém assentada retomou o caminho da escola, e em 2003, completou o Ensino Fundamental. Mesmo com a vontade de seguir com os estudos na época, as necessidades da vida falaram mais alto. “Tinha muito trabalho, os filhos eram pequenos.”

Esperou até novembro de 2013, e aos 43 anos, a agricultora ingressou no programa estadual de Educação de Jovens e Adultos (EJA Campo) para dar início ao Ensino Médio. De segunda a sexta-feira, após o dia de trabalho, Dona Júlia sai de sua casa azul rumo à escola Francesco Moura. Lá, estuda das 19h às 21h40. Em 2015, “se Deus quiser”, terá seu sonho de criança realizado.

Do paliativo à política pública

Membro do setor de educação do MST e coordenadora de cinco turmas de EJA no município de Serra Talhada, Sertão de Pernambuco, Ana Paula Monteiro Araujo destaca o fato de que “pela primeira vez temos turmas de jovens e adultos cursando o ensino médio dentro dos nossos assentamentos”. O caminho foi longo.


Segundo Maria Fernanda dos Santos Alencar, coordenadora da educação do campo no estado, “tudo vem da luta dos movimentos sociais.” Desde o início das ocupações de terras no estado, os Sem Terra já encaravam a exclusão escolar dos trabalhadores rurais. As primeiras iniciativas de alfabetização de jovens e adultos foram realizadas no calor da lona preta.

Em paralelo, o MST se uniu aos quilombolas, sindicatos rurais e povos indígenas para impulsionar mobilizações em prol de uma política de educação adaptada à realidade do campo.

Dessa pressão, surgiram as parcerias com o poder público. Após o programa Brasil Alfabetizado, o estado de Pernambuco estreou, em 2006, o programa Semeando Letras no Campo, que abrange da primeira à quarta série do ensino fundamental.

Em 2005, o Ministério da Educação (MEC) lançou o projeto Saberes da Terra (que passou a se chamar Projovem Campo – Saberes da Terra, em 2007), com o objetivo de resgatar a dívida histórica da sociedade brasileira com os jovens e adultos que vivem no campo e não tiveram a oportunidade de frequentar a escola. A meta: escolarizar 275 mil jovens agricultores em nível fundamental.

Em 2006, os Sem Terra ingressaram no Comitê de educação do campo no estado e começaram a acompanhar cada passo das quatro edições do programa, realizando um diagnóstico das necessidades, mobilização dos futuros educandos nas comunidades e elaboração do projeto político-pedagógico.

A luta protagonizada pelos camponeses fez com que o Movimento se firmasse como referência na educação do campo, passando a dirigir uma formação específica destinada aos professores do EJA.


As denúncias dos limites dos programas existentes, porém, não cessaram. “Esses projetos eram concebidos como paliativos, sem conseguir elevar o grau de escolaridade. Quem fazia alfabetização não tinha perspectiva de continuar”, explica Rubneuza Leandro, da direção do setor de educação.

Ao longo de seminários, marchas e ocupações, os Sem Terra pautaram a criação de um programa que garantisse uma continuidade na educação de jovens e adultos, da alfabetização até o nível médio.

Em 2013, após sete anos de luta, a reivindicação é atendida pelo governo: o programa EJA Campo entra em vigor, garantindo em nível do Estado todos os segmentos da educação aos jovens e adultos, com currículos e metodologia unificados. Para a coordenadora Maria Fernanda, a iniciativa é pioneira.

“Pela primeira vez a Educação de Jovens e Adultos se torna uma modalidade da educação básica. De programa compensatório, ela vira política pública.”

Segundo os dados da Secretaria de Educação, mais de 7 mil jovens e adultos ingressaram nas turmas da EJA Campo em 2013: 3272 no Ensino Fundamental (EJA inicial) e 4 mil no Ensino Médio (EJA médio).

 

Educação emancipadora

“Os alunos são muito comprometidos. Eles vêm para aprender, mas também para passar o que sabem”, observa a diretora da escola do assentamento Safra, Alzenir Socorro dos Santos (foto de capa), que também ensina línguas nas turmas do EJA.

Para lidar com um público que estuda após um dia de trabalho na roça, a aula tem que ser dinâmica e dialogar com a realidade. Com esses desafios colocados, os movimentos sociais e a Secretaria de Educação costuraram uma metodologia específi ca: os professores abordam as áreas de conhecimento a partir de temáticas organizadas entorno de um eixo articulador: trabalho e educação no campo.

Os tempos de aprendizagem são divididos em tempo escola e tempo comunidade. “Na escola, os educandos têm que apresentar toda a produção do assentamento durante o tempo comunidade”, exemplifica Alzenir. Para a educadora, a busca é por “uma pedagogia que contribua para libertar as pessoas.”

Tatiane de Souza Santos, fi lha de assentada e coordenadora de turmas de EJA no município de Petrolina, destaca que “a grande conquista é quando você chega num assentamento e vê aquele sujeito, que era analfabeto, sabendo ler e escrever.”

Ao criar vínculos de socialização, as aulas melhoram o convívio e reforçam a identidade nas comunidades. Atividades práticas e projetos produtivos, realizados com a ajuda de um técnico, também ajudaram a potencializar a produção. “Graças aos alunos do Saberes da Terra, temos hoje comercialização de galinhas e hortaliças, produzidas em assentamentos”, conta o pedagogo Adailton dos Santos Cardoso, membro da direção estadual do MST.

Embora os avanços sejam importantes, os obstáculos não faltam. Segundo Edilene Menezes Mota, assentada e coordenadora de EJA em Santa Maria de Boa Vista, a maior dificuldade é a permanência dos educandos dentro da sala de aula. Muitos chegam cansados do trabalho.

Outros têm que sair do assentamento em busca de renda, dificultando a escolarização. A infraestrutura precária é outro problema: em muitas escolas, mães assistem às aulas com as crianças, por falta de ciranda infantil. Seis meses após o início dos cursos, o material didático destinado aos alunos da EJA ainda não havia chegado. As merendas também faziam falta.


Rubneuza Leandro aponta outra contradição: “Os programas de EJA deveriam ser medidas temporárias, destinadas a reverter a exclusão histórica dos camponeses pelo sistema educacional. Mas, com o fechamento de escolas e a falta de investimento, o nosso sistema continua a criar analfabetos.”

No campo pernambucano, 2014 começou com uma avalanche de fechamento de escolas. Foram três só município de Santa Maria da Boa Vista. “As escolas restantes são superlotadas. No povoado vizinho, tem crianças estudando dentro de uma capela!”, denuncia a assentada Edilce de Maria.

Nos últimos dez anos, mais de 37 mil escolas do campo foram fechadas no país. Em 2012, pela primeira vez em 14 anos, a taxa de analfabetismo voltou a aumentar no Nordeste brasileiro, passando de 16,9% (2011) para 17,4%.




Superando uma história de exclusão 

Oito horas da noite. Na escola 13 de Maio, as aulas já começaram. Na primeira sala, curvados sobre as bancas, uma quinzena de homens e mulheres analisam livros de cordel. Na turma vizinha, Seu José e seus colegas escutam atentamente a professora.

Aos 62 anos, seu José de Silva está superando um histórico de exclusão. Criado na região de Petrolina, “no meio da caatinga”, o filho de agricultor não pôde estudar: “A escola estava distante, não tinha transporte.”

Sem terra, seu José trabalhou um tempo como meeiro. O fruto quase inteiro do trabalho ia para o dono; a solidão pesava sobre as costas do lavrador. “Quando ia à cidade, tinha medo. Pedia para outras pessoas irem pagar as minhas contas”, recorda.

A vida muda com a chegada ao assentamento Nossa Senhora da Conceição. Lá, Seu José começa, enfim, a trabalhar por conta própria. Superando a solidão, ele casa com dona Dilce, e juntos, rompem outra cerca: ele se matricula no programa Saberes da Terra e completa o ensino fundamental.

“Não estou tão jovem, mas não pretendo parar.” Os olhos de Seu José brilham por trás dos óculos. Em 2013, ele iniciou a EJA médio, rumo a outra pretensão: a faculdade.


Fonte: http://www.mst.org.br

domingo, 13 de setembro de 2015

SÍNDROME DO X-FRÁGIL



O que é Síndrome do X Frágil?

 A síndrome do X frágil é provocada pela mutação de um gene, o FMR-1, presente no cromossomo X que causa geneticamente o retardo mental mais comum.
Também chamado de Síndrome de Martin & Bell, foi descoberta em 1991, por pesquisadores franceses, holandeses e australianos. Com a mutação do gene causador da síndrome os neurônios são desenvolvidos de maneira mais atrasada, fazendo com que haja a ausência de uma proteína que tem reação variada de acordo com cada organismo.
Normalmente, a síndrome acontece mais em homens numa proporção de 1:2000, sendo que em mulheres pode ocorrer em 1:4000. Acredita-se que a maior manifestação dessa síndrome em homens ocorra pelo fato da mulher ter dois cromossomos X, o que leva o organismo feminino a compensar o gene FMR-1 se houver mutação.
 Recém-nascidos não apresentam indícios de aparência física que antecipem uma suspeita precoce da SXF. De forma semelhante a outros quadros clínicos, apresentam macrocefalia (perímetro da cabeça maior que o normal) e hipotonia (baixo tônus muscular), podendo esta revelar-se, por exemplo, na falta de força para sugar na mamada.
A síndrome do X frágil acontece por causa do número de repetições de nucleotídeos, ou seja, um gene normal possui aproximadamente 30 repetições da seqüência citosina, guanina e guanina, enquanto as pessoas com a síndrome possuem variavelmente entre 55 a 800 repetições, o que influencia também nas características do problema.
 Pessoas afetadas pela Síndrome do X Frágil gozam de boa saúde e sua aparência pode ser semelhante à de outras pessoas. Algumas características físicas, entretanto, são freqüentes e em geral se tornam mais evidentes após a puberdade: *orelhas grandes e de abano, *face alongada, *aumento dos testículos, *mandíbula proeminente, *pés chatos, *calos nas mãos, *palato alto, *ecolalia *fala repetitiva *leva tudo o que vê ao “pé da letra”. Porém, apresenta características positivas como boa memória, facilidade em percepções, bom vocabulário, habilidade com a leitura, Testes genéticos são realizados para detectar a síndrome. Apesar de não haver cura para tal problema é importante haver acompanhamento de pr ofessores especializados, fisioterapeutas e psicólogos para melhorar a qualidade de vida do indivíduo e seu desempenho.
Características Intelectuais. Atraso no desenvolvimento é a característica mais significativa das pessoas afetadas pela Síndrome do X Frágil. O comprometimento intelectual é variável, podendo ir desde uma dificuldade de aprendizagem a um retardo grave. Geralmente é acompanhado de atraso na fala e na capacidade de comunicação. Cada indivíduo pode apresentar muita desigualdade entre suas habilidades cognitivas. Parece incoerente que tenham bom desempenho no aprendizado de alguns tópicos e dificuldade em conceitos às vezes elementares.
Algumas das suas características podem ser bem aproveitadas: excelente memória; facilidade em identificar logotipos e sinais gráficos; geralmente bom vocabulário; facilidade para cópia; habilidade para leitura; uso de jargões e frases de efeito. As dificuldades estão principalmente na abstração e na integração das informações: seguem instruções "ao pé da letra"; podem dar importância a aspectos irrelevantes; fala fora do contexto; fala repetitiva; ecolalia. Alguns têm prejuízos muito pequenos, com desempenho praticamente normal.
Outros têm comprometimentos moderados, mas com atendimentos especializados chegam a bons resultados sociais e funcionais. Os indivíduos com comprometimento grave sempre precisarão de apoio. Tratamento: Terapias especiais e estratégias de ensino podem ajudar as pessoas afetadas a melhorar o seu desempenho, facilitando a conquista da independência que lhe for possível. As crianças devem ser acompanhadas por neurologista, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional e outros profissionais tanto da saúde como da educação. As áreas de atendimento especializado são definidas de acordo com cada indivíduo e devem se revistas ao longo de seu desenvolvimento. Educadores e terapeutas devem: minimizar estímulos que não sejam tão importantes naquele momento; dividir as atividades em blocos de acordo com seu tempo de atenção; reduzir a necessidade de contato visual e informar a criança sobre mudanças na sua rotina.
A dificuldade em lidar com estímulos excessivos pode levar a comportamentos inadequados como agitar as mãos, fala repetitiva e irritação, mesmo em situações em que suas habilidades cognitivas são suficientes para um bom desempenho.
O uso do computador tem sido muito eficiente para realizar atividades educativas: tem a vantagem de apresentar inúmeras vezes a atividade desejada, não requer a constante interação com outra pessoa, e possibilita ir além da proposta inicial quando houver interesse. Pessoas afetadas pela Síndrome do X Frágil tendem a imitar, portanto é imprescindível que se dê um modelo adequado. Eles sentem-se bem quando a rotina é seguida, aproveite e estabeleça uma rotina que lhes traga benefícios. É certo que não podem ser exigidos além de seu potencial, mas temos verificado que este potencial em geral é maior do que imaginávamos.

 Fonte:Equipe Brasil Escola / Bengala Legal / https://sites.google.com/site/anabastospsicopedagoga/sindrome-do-x-fragil

Explicando inclusão



A inclusão é para todos

O termo inclusão não abarca apenas pessoas que poderiam ser excluídas da Educação devido a dificuldades de aprendizagem. Ele abrange todas as crianças e todos os jovens, com saúde e desenvolvimento típicos ou não, de todas as etnias e as classes sociais, pois expressa o direito à educação de maneira ampla: qualquer dificuldade de aprendizado que se tenha, seja ela decorrente de qualquer condição, deve ser acolhida e solucionada pela escola. No caso dos alunos com deficiência, a inclusão parece ser mais evidente, mas isso não significa que os colegas considerados típicos não se beneficiem dela. "Estudos comprovam que alunos que estudam com coleguinhas com deficiência também aprendem mais", observa a psicopedagoga Sheila Pinheiro. Por que isso acontece? Porque, uma vez que a escola se engaja na busca por soluções de aprendizado, todos saem ganhando.

Chega de desculpas

"Não aprendi isso na faculdade" e "Não estamos preparados para recebê-lo" são algumas das justificativas ouvidas pelos pais quando um professor ou uma escola torce o nariz diante da obrigação de receber um aluno com deficiência. Mas o fato é que 1) Sim, a inclusão é uma obrigação e 2) Essas desculpas desqualificam a própria noção de educação, já que ensinar é muito mais do que transmitir um determinado conteúdo a uma criança típica - ensinar é saber ensinar a todos, e achar soluções para que isso aconteça. "Caso não se sinta preparada, a escola pode entrar em contato com a secretaria de educação de sua cidade e pedir orientação e verba", lembra a psicopedagoga Sheila Pinheiro. Mary Lopes reforça: "O pedagogo deve ter a capacidade de ensinar, seja lá para quem for".

Todos vão à escola?

Por lei, a criança brasileira em idade escolar deve estar matriculada. Em raros casos de doenças graves, quando um fator físico a impede de ir à escola (e isso seja comprovado por meio da declaração de um médico), é possível que a secretaria de educação local encaminhe um professor à casa dela. Mas é preciso pensar que esse tipo de situação é exceção, pois a regra é que todos frequentem a sala de aula. No caso de crianças com deficiência, o que pode ser feito é também encaminhá-las, no contraturno (quando não estão na escola), a um serviço de auxílio especial - este pode ser realizado na sala de recursos presente na própria escola ou em outra instituição especializada no atendimento à sua condição - como forma de complementar a sua educação.

Inclusão real

Aceitar alunos com dificuldades de aprendizado é uma coisa; garantir a eles o real acesso ao conteúdo é outra. Em outras palavras, a inclusão na prática é diferente da do papel. "Dar a vaga porque existe a lei não é suficiente", ressalta a psicopedagoga Sheila Pinheiro, lembrando que, a partir do momento em que a escola recebe uma criança com deficiência, todos, do porteiro ao diretor, têm de participar do processo de inclusão. "A diferença deve ser aceita com naturalidade, afinal, todos somos singulares", argumenta Mary Lopes, lembrando que, em casa, toda criança é reflexo dos valores familiares. Assim, é importante que todos os pais, tenham eles filhos considerados típicos ou não, abram-se à inclusão e transmitam o princípio da igualdade no dia a dia.

Adaptações curriculares

Elas são essenciais para que a escola seja de fato inclusiva. Não adianta querer ensinar o mesmo conteúdo para todos os alunos, muito menos se utilizando do mesmo método. "É preciso ensinar o que a criança pode aprender dentro das possibilidades dela", lembra Carmen Lydia da S. Trunci de Marco, diretora do Colégio Pauliceia. A psicopedagoga Sheila Pinheiro concorda e orienta: "A primeira pergunta é: ‘o que a criança sabe?’ Partindo dessa resposta, vem ‘aonde quero que ela chegue?’". Com uma meta clara, mirando as habilidades a serem conquistadas, professores e coordenadores têm de pensar em soluções concretas para que currículo seja transmitido de maneira funcional, com vistas no que realmente é preciso saber para se viver bem em sociedade. Ou seja: mais prática e menos teorização abstrata.

Pais: confiança no valor da escola

É natural que os pais de crianças com deficiência se sintam inseguros diante da inclusão na escola regular. Entre as questões que cruzam suas mentes, em geral estão a possibilidade de seu filho não receber tratamento adequado (ou, pior, ser maltratado por colegas) e a real chance de ele aprender. A boa notícia é que, em geral, a criança com deficiência é bem acolhida por seus coleguinhas. Em relação ao aprendizado, como acontece com qualquer outra criança, é preciso acompanhar dia a dia a sua evolução, participando ativamente da vida escolar de seu filho. "A escola é o melhor para a criança, sempre. O ser humano aprende com os seus pares - na convivência, o cérebro é estimulado.

Fonte:http://arivieiracet.blogspot.com.br/