“Na vida só há um modo de ser feliz. Viver para os outros.”

Léon Tolstoi

sexta-feira, 29 de julho de 2011

A Criança, a Escola e a Saúde Mental

Depois da família, a escola é o agente mais importante da socialização da criança. Com a entrada na escola, a criança entra num contexto social mais amplo e diferenciado. Especialmente para as crianças que nunca puderam frequentar a creche ou o jardim infantil, a escola primaria representa a primeira experiência de relações mais amplas e constantes fora do círculo familiar, a primeira relação com o grupo de colegas e com figuras de adultos estáveis diferentes das familiares.

Durante um grande período da vida, todas as crianças e jovens são acolhidos pela escola, e é neste espaço de tempo em que se desenvolvem fisicamente, cognitivamente e se desenvolvem competências fundamentais para a formação da personalidade, a escola irá, portanto, continuar, integrar e ampliar a obra educativa dos pais. Depois da família, é a escola que exerce a influência máxima.

A escola é uma organização complexa e com níveis hierárquicos de funcionamento.

À Escola esperam-se novos desafios:


• Transmissão de conhecimentos
• Educar para os valores
• Promover a saúde
• Actividade cívica dos alunos
• Promoção de autonomia

A educação falha se não toma cm consideração todas as interligações da criança com o ambiente, se está, distanciada da sua vida real, das condições subjectivas, da história precedente do desenvolvimento de cada aluno, das suas capacidades e interesses.

A etapa da infância e adolescência assume extrema importância e vulnerabilidade, estes jovens vão se encontrar num processo de formação de hábitos, crenças e competências, que irão permitir desenvolver o sujeito como pessoa e cidadão. Se bem que aos seis anos o desenvolvimento mental e social da criança já seja adequado para enfrentar a experiência escolar, a entrada na escola representa sempre um trauma afectivo. A criança que nunca frequentou a creche entra num mundo desconhecido, onde vigoram regras e relações nunca antes experimentadas. De centro da atenção familiar, ela torna-se num anónimo entre vários. Agora deve contar com os outros.

A criança em idade escolar continua a depender dos pais, quer material quer emotivamente e, simultaneamente, torna-se mais ampla a área das relações com o grupo dos colegas. A escola representa o lugar privilegiado onde ela tem a oportunidade de experimentar novas relações interpessoais que a ajudam no seu processo de socialização e onde pode exercer uma certa independência própria. Aqui tem a ocasião de ser aprovada ou desaprovada.

Toma contacto com outras crianças, que lhe dão a oportunidade de rever as suas relações primárias com os irmãos e as irmãs.

Há crianças que podem encontrar dificuldade em fazer amizades, porque transferem para as novas relações com os pares as dificuldades e os conflitos do seu ambiente. A este respeito é muito importante a acção do professor acompanhando cada criança, intervindo no momento oportuno, tranquilizando a criança. Ele (o professor) tem uma função determinante no êxito ou insucesso escolar da criança. Pode organizar as emoções da criança e canalizá-las com vista à realização de determinadas metas escolares.

As novas amizades e o grau de aceitação de que goza podem reforçar na criança a sua auto-consideração fazendo-lhe compreender que é capaz de amar e que consegue fazer-se estimar e amar por seu lado; pode diminuir o seu sentimento de culpa e aumentar a confiança em si própria e nos outros.

Além disso a criança descobre as suas insuficiências e a necessidade de se completar na relação com os outros, descobre o prazer da solidariedade do grupo e é levada a sublimar e superar sentimentos de inveja e de ciúme. A criança torna-se, cada vez mais, capaz de se pôr em pontos de vista diferentes do seu, e isto torna possível formas de colaboração, além das do jogo, em actividades de exploração, de construção, onde é necessária uma actividade de projecção colectiva.

O primeiro encontro da criança na escola é com o professor. Ele recria uma nova relação afectiva, caracterizada frequentemente pela ambivalência. Em muitos aspectos a relação criança-professor copia a relação filho-pais, sobretudo na escola primária; na escola secundária o ambiente assemelha-se menos ao familiar.

O professor constitui um modelo notável de identificação, fora da família e o processo de identificação é certamente favorecido pelo facto de que a criança, na escola primária, tem um único professor. Contudo, enquanto que uma parte da turma se identifica mais completamente com o agente socializador, a outra parte identifica-se mais com o grupo dos pares.


O professor, numa sociedade onde a família está em crise e quase ausente da socialização da criança, substitui-se aos pais. Ele conduz o aluno a assumir novas atitudes mentais, novos valores, novos conhecimentos e novas motivações.

Na presença dos factores socioculturais que influenciam no rendimento escolar, dos problemas e conflitos psicológicos ligados à dinâmica familiar, a escola em vez de estar adequada à tarefa de aplanar as desigualdades iniciais do ambiente social e de ir ao encontro das necessidades dos conflitos psicológicos dos alunos, revela-se frequentemente uma instituição que contribui para a desadaptação.

A escola, que deveria tentar promover os que têm mais necessidade dela, tende inversamente a expeli-los porque embaraçam o trabalho dos «normais» e implicam um maior empenhamento do professor com o ensino individualizado; e também porque os que já sabem teriam de outra forma, sacrificar tempo para esperar que crescesse o nível dos que não sabem e que apresentam dificuldades em aprender.

Como já foi referido, um dos períodos mais dramáticos na infância corresponde à entrada na escola, especialmente se não frequentou a pré-primária, podemos constar que existem uma crise de componentes ao mesmo tempo psico-fisiológicos e psico-sociais.

Do ponto de vista físico coincide com o fim da primeira dentição, o alongamento da estrutura que torna a criança mais delgada, mais frágil, pelo menos de aspecto, e mais receptiva ás doenças contagiosas.

Do ponto de vista mental, o interesse da criança que se concentrava em si própria passa a incidir sobre as coisas, sobre o mundo exterior e sobre o desejo de compreender as intenções das pessoas. A criança passa a preocupar-se com a opinião dos outros e procura entrar em relações com os seus semelhantes, dando-se portanto uma modificação mental.

A escola deve ser acolhedora, presentemente a escola já deixou de ser representada pelo professor austero, exigente, que nunca sorria, aliás já está (a escola) cada vez mais consciente do seu papel social. Já não se dedica exclusivamente ao ensino e engloba uma série de actividades escolares capazes de atrair a criança, próprias dos seus interesses e especialmente de interesse social. A criança sabe que na escola pode brincar com os colegas, participa em festas e outras actividades de carácter mais lúdico.

No entanto, é sobretudo à família quer compete preparar as crianças para esta nova situação, e sobre isso convém dar aos pais conselhos apropriados. Acontece muitas vezes, quando a criança antes de entrar na escola se porta mal, frequentemente se houve "quem dera o momento de poder meter-te na escola" ou "quando fores para a escola logo vês!". Sugere-se assim à criança a ideia de que a escola é um sítio terrível, onde não se toleram gracejos, onde não se pode fazer nada do que se quer, acima de tudo um local onde se castiga.

Tudo isso permanece muito confuso na criança e é justamente essa confusão, muito pouco, representativa, muito pouco intelectualizada, com falta de afectividade, que age, poderosamente sobre a disposição da criança.


Como forma de apoio à criança com vista à sua integração e acolhimento no meio escola, há que ter em atenção diferentes instâncias facilitadoras do processo de socialização: confiança, autonomia, iniciativa empatia e auto-estima.

a) Confiança - é a crença nos outros que permite à criança aventurar-se à acção, sabendo que as pessoas de quem depende lhe proporcionarão o apoio e o encorajamento necessários. "Estar presente e ser autentico" (João dos Santos).

b) Autonomia - é a capacidade de independência e de exploração, embora necessite de uma ligação muito estreita com os educadores (pais e professores), a criança também precisa de desenvolver uma percepção de si própria como pessoa distinta que é capaz de fazer as suas escolhas e de realizar coisas para si própria.

c) Iniciativa - é a capacidade de que a criança tem de começar uma tarefa e de a levar até ao fim. É a capacidade de que a criança tem de começar uma tarefa e de a levar até ao fim, de avaliar uma situação e de actuar de acordo com o entendimento que tem dessa situação.

d) Empatia - é a capacidade que permite à criança compreender os sentimentos dos outros por os poder relacionar com sentimentos que ela própria já experimentou. os adultos reforçam a capacidade de empatia se corresponderem e reconhecerem os sentimentos das crianças e se as encorajarem a participar e cooperarem com os pares.

e) Auto-estima - a confiança positiva na nossa própria capacidade de dar contributos positivos a outras pessoas ou situações, um núcleo forte de orgulho interior - é uma atitude que pode sustentar as crianças nas dificuldades e pressões das suas vidas. A auto-estima desenvolve-se quando a confiança, a autonomia, a iniciativa e a empatia estão firmemente enraizadas e quando as crianças têm oportunidades de realizar experiências com sucesso. Ironicamente, são as experiências negativas proporcionam as melhores alturas para construir a auto-estima, se os adultos tiverem paciência necessária para adoptarem o ponto de vista da criança e encorajarem a resolução de problemas.


As experiências de movimento não são apenas importantes para o desenvolvimento físico das crianças, são-no também para o fortalecimento das suas capacidades sociais e cognitivas. Por exemplo, ter êxito nas actividades de movimento aumenta o sentimento de competência e de auto-estima da criança. Além disso, as actividades de movimento proporcionam ocasiões para a prática de aptidões valiosas como as capacidades de prestar atenção de seguir instruções e de relacionar linguagem com movimento - todas elas capacidades que contribuem para as aptidões académicas da criança.

Torna-se necessário um trabalho dinâmico e permanente a nível institucional e transdisciplinar, onde profissionais do ensino, da saúde, a própria família, comunidade, poder local, trabalhem em parceria para proporcionar as melhores condições para um ambiente de aprendizagem.

Os programas de saúde escolar desenvolvidos nas instituições de ensino podem ajudar os estudantes a responder a um conjunto de riscos que possam comprometer um desenvolvimento saudável. A educação, para além do papel formal de “ensinar” terá que: ir de encontro a estilos de vida saudável, promover acções para o cuidado e protecção das crianças e jovens e criar mecanismos para a construção de uma cultura de saúde.
Um programa de saúde escolar a promoção e a prevenção devem considerar-se como uma estratégia fundamental e indispensável para o programa. A estratégia é o meio para atingir objectivos que responde à pergunta que é “como fazer?”.

A Saude Mental e a Escola

Por definição entendemos que a saúde mental é a capacidade de adaptar-se às situações diárias ou dificuldades que a vida quotidiana apresenta.

A saúde mental de uma criança é um processo constante de adaptação às suas próprias transformações biológicas, crescimento, e às mudanças psicológicas de forma a entender o seu mundo e o mundo que o rodeia ao longo das diferentes idades em função das capacidades que vai adquirindo e decorrente das relações que estabelece com o exterior.

A saúde mental é um processo de adaptação que depende de factores endógenos e exógenos. Se este processo se altera, por diversas razões, pode produzir alterações no comportamento ou transtornos mais ou menos graves.

A abordagem da saúde mental passa por uma dimensão integral onde se consideram os aspectos biológicos, psicológicos e sociais, que modificam o estado de saúde de uma criança e a sua qualidade de vida depende de muitos factores, tais como o comportamento humano, onde a culturalidade necessita ser compreendida e respeitada.

As condições de vida como a pobreza, desigualdade, discriminação, falta de equidade são factores que produzem dano psicossocial, causando um grande impacto na família que é a unidade fundamental da sociedade e meio natural onde se desenvolvem as crianças. Estas são um grupo vulnerável, devem ser protegidos, ajudados e educados por princípios de convivência sã, ambiente de respeito, num contexto construtivo de valores, virtudes e tolerância.

Existe predisponência hereditária para a doença mental que se adquirem e desenvolvem decorrentes da interacção com determinados ambientes e que produzem alterações ou transtornos mentais em crianças/jovens, bem como causa desconhecidas.

A OMS – Health for all – estabeleceu metas de saúde para os próximos anos, tendo a promoção da saúde e os estilos de vida saudáveis uma abordagem privilegiada no ambiente escolar, e os serviços de saúde um importante papel na promoção, prevenção, diagnostico e tratamento, no que se refere à saúde das suas crianças.


A educação para a saúde integral responde às necessidades do aluno em cada etapa do seu desenvolvimento. Visa a saúde como uma construção social, abordando a inter-relação dos problemas de saúde com os seus factores determinantes, dentro de cada contexto. Incorpora a Educação para Saúde em nível curricular e como parte do projecto institucional. Utiliza todas as oportunidades educativas a nível formal e informal para promover a saúde.

Promove a reflexão e a análise crítica da informação; facilita a tomada de consciência dos estudantes e da comunidade educativa como um todo. Procura desenvolver novos conhecimentos e habilidades que contribuam para a adopção e manutenção de estilos de vida saudáveis, por meio de técnicas participativas e actividades significativas que possam transcender o âmbito escolar.

A criação e manutenção de ambientes físicos e psicossociais saudáveis implica a promoção de um ambiente escolar físico seguro, limpo e com estrutura física adequada; com um ambiente psico-social que promova relações interpessoais positivas, sem agressão, violência, álcool ou drogas; com igualdade nas questões de género, estimulante para todos os seus membros e que favoreça a aprendizagem. Este componente promove a escola como um espaço de trabalho saudável, tentando melhorar, por meio do diálogo e do consenso, as condições de trabalho e estudo.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
- Ainscow, Mel – Necessidades Especiais na sala de aula – um guia para a formação de professores – I.I.E edições Unesco,2000
- BRICKMAN, N. - Aprendizagem activa, Fundação Caloust Gulbenkian, Lisboa, 1991
- Coll,César; (et. al.). Desenvolvimento psicológico e educação - 2: psicologia da educação escolar 2 ed. - Porto Alegre - Artmed - 2004
- Correia, Luís Miranda – Inclusão e Necessidades Educativas Especiais – um guia para educadores e professores – Colecção Necessidades Educativas Especiais, Porto Editora, 2004
- DI GIORGI, P. - Relação entre natureza e cultura - a criança e as suas instituições, Livros Horizonte, Lisboa, 1982
- Forreta, F.Marques, António Manuel, Vilar, Duarte – Educação Sexual no 1º ciclo – um guia para professores e educadores – Texto Editora, 2002
- GARCIA, M. Adelina de Abreu Garcia (1994). Multiprofissionalismo e intervenção – as escolas, os projectos e as equipas. Colecção Perspectivas Actuais, Educação. Porto, Edições Asa
- Magalhães, Teresa - Maus tratos em crianças e jovens. Coimbra: Quarteto Editora, 2005
- OLIVEIRA, J.H. Barros de; Oliveira, A.M. Barros (1996). Psicologia da educação escolar, Vol I, Aluno-Aprendizagem; Livraria Almedina, Coimbra
- OLIVEIRA, J.H. Barros de; Oliveira, A.M. Barros (1996). Psicologia da educação escolar, Vol II, Professor-ensino; Livraria Almedina, Coimbra
- PAPALIA, Diane; Olds, Sally (2001). O mundo da criança, MCGrawHill
- Postic, Marcel –A relação Pedagógica - Coimbra Editora, 1990
- SPRINTHAL, Norman A.; Collins, W. Andrews (1999). Psicologia do Adolescente, uma abordagem desenvolvimentista, 2ª edição, Fundação Calouste Gulbenkian, Serviço de Educação, Lisboa
- SPRINTHALL, N.; Sprinthall, R. (1993). Psicologia educacional. McGraw Hill
- VAYER, P. - O diálogo corporal. Socicultura, Lisboa, 1976
- VAYER, Pierre; Destrooper (1976). A dinâmica da acção educativa - para a infância, normal e/ou inadaptada, 2ª edição. Horizontes pedagógicos, Instituto Piaget
- VEIGA, F.(1995). Transgressão e autoconceito dos joves na escola - Investigação diferencial. Fim de Século Edições, Lisboa
- WEINER, Irving B. (1995). Perturbações psicológicas da adolescência. Fundação Calouste Gulbenkian, Serviço de Educação, Lisboa


Fonte: http://saudementalescolar.blogspot.com/

Nenhum comentário:

Postar um comentário