Fonte: Banco de Imagens
Conhecer o aluno é o primeiro passo, diz especialista.
Por Leonardo Guariso
Um ambiente de ensino onde todos possam aprender, tendo deficiência ou não. Em resumo, assim é denominada a educação inclusiva que, segundo Eugênio Cunha, mestre em Educação e autor do livro Práticas pedagógicas para inclusão e diversidade (Wak Editora, 2011), apenas começou a caminhar no Brasil. "Já houve progressos, mas será que os alunos estão recebendo a educação adequada?", questiona o professor. A preocupação de Cunha é a mesma de tantos outros educadores e familiares. De que adianta o estudante com deficiência frequentar uma escola regular se o professor não sabe como lidar com esses distúrbios? O problema, segundo o pesquisador, é que não existe uma formação específica que qualifique o profissional. Pior: há pouca literatura pedagógica a respeito. "O professor fica sem suporte", afirma. E o aluno, à mercê.
Muito prazer, aluno
Como deve ser, então, o trabalho inclusivo do educador? Para o autor, a inclusão escolar começa na alma do mestre. "Precisamos atrair nossos alunos por meio de afeto", diz. Cunha refere-se ao desejo de aprender do estudante como um caminho para conquistá- lo para, então, direcioná-lo ao conhecimento. Quando isso acontece, todos aprendem juntos.
Não existe uma formação específica que qualifique o profissional
Em sua obra, o professor explica que o afeto é um instrumentomediador da aprendizagem, pois trabalha a memória, a cognição e as emoções. O afeto, nesse caso, abre caminho para enriquecer relacionamentos e proporcionar uma aprendizagem de qualidade. E isso vale para qualquer disciplina e qualquer nível de modalidade de ensino. Conhecer o aluno, portanto, é fundamental.
Atividades do Bem
A dicas deste quadro são apenas uma referência em práticas pedagógicas para a educação inclusiva, pois, de acordo com os profissionais entrevistados nesta reportagem, cada indivíduo é único - nem sempre o que funciona para um funciona para o outro. Além disso, pode ser que a criança não apresente apenas um comprometimento ou uma demanda entre as enumeradas na lista a seguir.
Falta de concentração e conservação das informações
Primeiro, descubra o que desperta a atenção do aluno e só então proponha atividades. Uma sugestão é a brincadeira do espião. Em dupla, cada integrante observará bem a outra pessoa.
Os dois se viram de costas e fazem uma mudança no visual. Depois, um de frente para o outro, tentam descobrir o que mudou. Trabalhe com música. Tocar violão, por exemplo, estimula a concentração e desenvolve a memória.
Autismo
Concentre-se no contato visual. Olhe nos olhos do aluno, fale de forma serena e objetiva (assim, as falas são mais bem compreendidas). Nem sempre o autista assimila frases como "Não faça isso!". Em cada atividade, portanto, mostre o que fazer. Dê funcionalidade às ações.
Síndrome de Down
Respeite o ritmo do aluno sem impor nada e não o trate infantilizadamente. Use fotos de familiares para estimular a fala e a memória visual. Exemplo: peça para o aluno contar histórias ou abordar aspectos interessantes da vida familiar. Estimule a prática de esportes, como a natação, que refinam a condição motora do estudante.
TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade)
Estabeleça e organize rotinas de trabalho para inibir a dispersão. Se for preciso, reveja o método de ensino para torná-lo criativo. Priveligie trabalhos curtos, realizando uma tarefa por vez. Não peça a um aluno, por exemplo, que copie da lousa um texto extenso. Desse modo, você conserva o foco de atenção do indivíduo.
Transtornos emocionais
Proporcione um ambiente educativo agradável (lembra da dica "conheça seu aluno"?). Solidarize-se e converse com o estudante e ensine-o a lidar com as perdas, pois elas são naturais.Desenvolva no aluno habilidades para superar desafios e perseverança na conclusão de tarefas. É importante impor limites.
Dislexia
Mostre a semelhança e a diferença entre as letras. Exemplo: a letra B tem a "barriga" voltada para a direita e a "perna" para cima. Evite o excesso de conteúdo para que o aluno tenha melhor compreensão do que é ensinado. Trabalhe com histórias em quadrinhos e peça que ele faça associações entre as ilustrações e o texto, criando alternativas e mudanças na história ou nas imagens.
Dispraxia (disfunção motora)
Incentive a prática de atividades físicas. Elas ajudam a desenvolver a coordenação motora, a orientação espacial e o equilíbrio. Outra dica é o uso da música para aumentar a capacidade de atenção e memorização. Pode ser assim: a cada toque de determinado instrumento musical, os alunos brincam com um objeto ou fazem algum movimento - ao som do tambor, por exemplo, as crianças mexem as mãos. Utilize materiais pedagógicos sensoriais, como letras escritas em pedaços de papel ou em madeira para que a pessoa forme palavras.
Surdez
Posicione o aluno na primeira fileira, de preferência, à sua frente. Quando realizar atividades, faça-as em turma para intensificar o vínculo de inclusão. Fale de frente para o estudante para que ele possa ler seus lábios. Diga aos colegas de sala para que façam o mesmo.
Cegueira
Oriente o aprendente sobre a posição do mobiliário e evite mudar os objetos de lugares. Incentive-o a aprender Braille. Ofereça materiais concretos para ajudá-lo a aumentar seu conhecimento. Isso inclui conceitos linguísticos, matemáticos, geográficos. O Instituto Benjamin Constant (www.ibc.gov.br) desenvolve materiais com texturas diferentes para que o aluno possa "ver" utilizando o tato.
Esperar que o mesmo educador seja capaz de abordar diversas necessidades é fantasioso
Evidentemente, há outros aspectos a serem abordados. Muita informação deve ser obtida dos pais e também da equipe - médicos, fonoaudiólogos, fisioterapeutas - que atende o estudante. E, claro, do próprio aluno. "Para um estudante com baixa visão, nada melhor do que ele mesmo dizer se há muita ou pouca luminosidade para enxergar o quadro", explica Selma Inês Campbell, autora do livro Múltiplas faces da inclusão (Wak, 2009). Os educadores também são fontes importantes: "Professores de séries anteriores podem nos esclarecer quais habilidades o aluno já desenvolveu", conta.
Difícil aceitação
E quando a pouca informação referente aos estudantes com necessidades específicas parte da turma? Campbell afirma que preconceito vem de desconhecimento, e esclarecer é o primeiro passo. "A escola deve cultivar valores como respeito ao próximo e solidariedade", explica. Vale até uma conversa com a família do aluno.
Vencidas essas dificuldades, que podem ser superadas por ações em conjunto com gestores e demais profissionais do colégio, o professor poderá elaborar atividades para serem realizadas em grupo - no caso dos pequenos, o modelo pedagógico criado pela educadora italiana Maria Montessori (1870-1952), caso ainda não seja utilizado.
"Os materiais montessorianos podem ser manipulados de diferentes maneiras, porque são sensoriais e de conceitos universais, relacionando-se com o todo", explica Cunha. De acordo com o autor, eles foram inspirados na educação especial, mas podem ser usados por todos os alunos.
No método, peças sensoriais geométricas - pirâmides e esferas de tamanhos diferentes -são utilizadas para apresentar a linguagem. Cada uma delas tem uma cor e possui um significado linguístico. Com isso, o aluno pode montar uma frase, juntar um substantivo a um adjetivo, aprender geometria ou até mesmo desenvolver a coordenação motora. "Esses materiais introduzem as sementes do interesse, da qual a criança colherá frutos nas próximas fases da educação", afirma.
Um professor, mil funções
É preciso deixar uma coisa clara: esperar que o mesmo educador seja capaz de abordar diversas necessidades é fantasioso. "Um professor hábil para lidar com surdez não pode ser o mesmo para lidar com cegueira, pois os recursos são diferentes", afirma Campbell. É aquela velha história do músico que sabe tocar um pouco de guitarra, de baixo, de violão, de bateria e de teclado, mas que, na realidade, não é expert em nehuma delas, pois não se especializou em nada. "É condenar tanto o aluno quanto o professor ao fracasso", finaliza.
Fonte: http://revistasentidos.uol.com.br/inclusao-social/67/artigo242134-2.asp
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