“Na vida só há um modo de ser feliz. Viver para os outros.”

Léon Tolstoi

domingo, 29 de maio de 2011

E então virei educadora…

Por Edneia

Fonte: Banco de Imagens
Meu universo girava em torno da dança, da política e da literatura. Horizontalmente, sem prevalência de nada. Em um mesmo dia ensaiava uma coreografia, participava de um grupo de estudo do “Capital” e de um sarau no movimento popular de arte.

Em família de funcionários públicos, prestar concurso é parte da tessitura do futuro, e assim sendo, prestei e passei no concurso para educadora de adultos aos 18 anos. Emprego perfeito para uma legítima “bicho grilo”: dias livres, 3 horas diárias de trabalho noturno, formações um sábado por mês… muito tempo livre pra arte, política e literatura.

A transformação em educadora e os ritos decorrentes não foram um evento importante naquele momento: cresci cercada de professoras, e o cotidiano de planejamento, avaliação etc. não eram novidade. Novidade eram eles, os alunos, eles sim transformaram minha vida e continuam dando o tom de meu percurso profissional.

Minha 1ª turma funcionava no prédio de uma escola semi-pronta em um conjunto habitacional chamado Pró Morar Rio Claro, construído sobre um lixão. Meus alunos eram moradores e vítimas deste conjunto. Um ano após o início deste trabalho fui transferida para uma sala de aula improvisada no refeitório de uma creche também na zona leste de São Paulo, no Jardim Santo André. Durante 3 anos trabalhei com esta turma e até hoje, 24 anos após o término desta experiência, se fechar os olhos consigo visualizar cada aluno, cada cadeira inadequada, cada mão que tremia, cada folha de caderno que ia sendo povoada, mas sempre me vejo com a idade atual tentando resolver as questões colocadas pelos meus alunos, essas sempre serão as questões mais importantes e decisivas. Esse também é meu jeito de sentir saudade de um momento que somente agora consigo dimensionar.

Neste período conheci Paulo Freire, meu “formador” por 3 anos no sentido mais profundo contido nesta palavra. Foi com ele que teci minha ação educativa e por ele abandonei o serviço público ao perceber que não poderia mais desenvolver o trabalho intensamente construído ao longo de 4 anos.

Afastei-me da sala de aula acreditando que a experiência vivida fora um presente tão grande, tão bem aproveitado e completo, que se esgotava ali mesmo.

Estudei Sociologia e Política, atuei na área de pesquisa socioeconômica, gestão e formação de educadores da infância, juventude e arte educação (dirigi até Circo-escola)… Tanta coisa… até reencontrar a EJA, e de repente tudo fazer sentido. Acho que a essência que move minha história é a mesma: a política, a literatura e a dança, porque apesar da bailarina ter ficado lá na juventude, a sustentação que joga pra frente meu “jéte elancés” continua sendo a confiança na cidadania ativa como força propulsora do meu ideal de igualdade social.

Na verdade acho que não voltei pra EJA, apenas continuei seguindo em direção a esse lugar parecido com felicidade, no meu caso uma sala de aula como aquela em que vivenciei o privilégio de me descobrir parte da grande engrenagem que tenta mudar o mundo.


Sobre Edneia
Cientista social com especialização em educação. Pesquisadora da área de EJA com autação nas áreas de formação de docentes e gestores educacionais e elaboração de projetos socioeducativos. Assessora técnica da AlfaSol.


Fonte: http://www.cereja.org.br/historias/?author=9

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